A interdisciplinaridade na formação farmacêutica: uma abordagem à luz da Fenomenologia

Abstract

Este estudo tem como objetivo compreender a interdisciplinaridade no currículo e na formação do farmacêutico para atuação no Sistema Único de Saúde (SUS), a partir da experiência de coordenadores de curso de Farmácia da região Centro-Oeste. Para o alcance dos objetivos, optamos pela pesquisa qualitativa, na modalidade do fenômeno situado, vertente metodológica da fenomenologia. Seguindo essa trajetória fenomenológica, chegamos ao depoimento de dezesseis coordenadores de curso, que responderam a seguinte pergunta: Como você compreende (o que significa para você) a interdisciplinaridade: (1) no currículo; (2) na formação do farmacêutico; (3) na atuação do farmacêutico para o SUS. Realizamos a análise ideográfica para obter a compreensão individual dos depoimentos. Posteriormente, evidenciamos as convergências e divergências entre todos os depoimentos através da análise nomotética. A partir dos resultados, destacamos oito temas: (A) Revelando o significado da interdisciplinaridade no currículo; (B) Relacionando a interdisciplinaridade com a organização curricular e métodos de ensino-aprendizagem; (C) Desvelando a interdisciplinaridade nos estágios, pesquisa e extensão; (D) Abordando a formação docente para a interdisciplinaridade; (E) Tratando da formação interdisciplinar, integral e humanista dos acadêmicos e sua relação com a interdisciplinaridade; (F) Relacionando a formação generalista com a interdisciplinaridade; (G) Abordando a interdisciplinaridade no trabalho em equipe multiprofissional; (H) Discutindo a inserção do farmacêutico no SUS e o trabalho interdisciplinar. Os resultados revelam que a interdisciplinaridade é compreendida pelos entrevistados, no currículo, como a justaposição de disciplinas e áreas do conhecimento sem levar em consideração a cooperação e a interação, o que as aproxima de um currículo multidisciplinar. Na formação farmacêutica, apesar da interdisciplinaridade ter sido citada como fundamental, os entrevistados revelam que ela não está ocorrendo na prática. Ainda, os depoimentos demonstram que o papel do farmacêutico no SUS não está sendo bem compreendido pelos gestores de cursos de Farmácia. Nesse sentido, a pesquisa revela que a interdisciplinaridade no currículo e na formação farmacêutica para atuação no SUS não vem sendo compreendida, muito menos desenvolvida de forma satisfatória pelas instituições formadoras, segundo a compreensão dos coordenadores de curso de Farmácia entrevistados. De acordo com as interpretações dos depoimentos obtidos, desvelamos que a formação farmacêutica deve ser revisitada, a partir da mudança de cenários nos quais se realizam as ações educativas, trazendo para locais mais próximos da realidade social e sanitária. Além disso, outras mudanças são necessárias, como integração ensino-pesquisa-serviço; capacitação para a utilização de metodologias de ensino-aprendizagem inovadoras; qualificação docente; apoio para a formação integral, reflexiva e humanista do acadêmico; complementação da formação através da pós-graduação; bem como a inclusão de elementos facilitadores para o trabalho interdisciplinar na academia e nas equipes de saúde. A pesquisa possibilita uma nova forma de compreender e refletir sobre a formação farmacêutica interdisciplinar, sob o olhar fenomenológico, ao passo que permite romper nossos limites da compreensão filosófica sobre o tema. Assim, este trabalho possibilita-nos refletir acerca da proposta interdisciplinar, a fim de construirmos a educação farmacêutica sob uma nova perspectiva, levando em consideração o homem enquanto ser-aí e ser-no-mundo, sempre lembrando da importância de refletir sobre nossa vida e nosso trabalho.

ABSTRACT - The purpose of this study is to investigate the role of interdisciplinarity in the curriculum and professional education of pharmacists, as well as in their practice in the setting of the Brazilian Unified Healthcare System (SUS). The investigation drew on the experience of coordinators of a Pharmacy program in midwestern Brazil. Qualitative research, conducted under the “situated phenomenon” modality of phenomenology, was the approach selected to analyze the responses provided by sixteen Pharmacy Program coordinators to the following question: How do you understand interdisciplinarity (what does it mean to you): (1) in the Pharmacy curriculum, (2) in the professional education of pharmacists, and (3) in the practice of pharmacists in the SUS setting? The discourses were individually interpreted using ideographic analysis. Nomothetic analysis subsequently brought into focus their mutual convergences and divergences. Eight themes emerged from these analyses: (A) the meaning of interdisciplinarity in the curriculum; (B) curricular organization and teaching–learning methods; (C) internship, research, and continuing education; (D) degrees held by faculty; (E) a comprehensive, humanistic, interdisciplinary education for students; (F) generalist education; (G) engagement in multiprofessional teams; and (H) engagement in the SUS setting. The results revealed that interdisciplinarity in the curriculum is understood by the respondents as a juxtaposition of courses and knowledge areas, without regard to interactive, cooperative aspects capable of bringing these courses and areas closer to a multidisciplinary curriculum. Despite describing interdisciplinarity as a decisive component, the respondents acknowledged its absence in the actual training of pharmacists. The responses also revealed that the role of the pharmacists in the SUS is not well understood by Pharmacy program managers. The role of interdisciplinarity for subsequent engagement in the SUS has not been satisfactorily understood or explored at educational institutions. Based on the interpretation of responses, inference can be drawn that pharmaceutical training should be revisited, taking into account the settings in which educational activities take place, so as to bring them closer to actual social and health-related situations; integration of teaching, research and service; changes in teaching–learning methods; degrees earned by faculty; support for a comprehensive, humanistic, reflexive education for students; supplementary development in the form of graduate studies; and inclusion of elements capable of fostering interdisciplinary work both in Pharmacy programs and within teams engaged in the SUS. By employing a phenomenological focus, this investigation provided a new approach to reflecting on and understanding interdisciplinary pharmaceutical training, while also expanding the boundaries of our philosophical understanding of this subject. By fostering reflections on the interdisciplinary approach to pharmaceutical training, the study provided elements for constructing the education of pharmacists under a new perspective, addressing man as Being-there (Dasein) and Being-in-the-world (In-der-Welt-sein), while reminding us of the cruciality of reflecting on our own lives and our own work.