1 MAITHE VENDAS GALHARDO DESEMPENHO DO CÁLCULO DE RISCO PARA PRÉ- ECLÂMPSIA NO PRIMEIRO TRIMESTRE POR MEIO DO SOFTWARE DISPONIBILIZADO PELA FETAL MEDICINE FOUNDATION (FMF). CAMPO GRANDE 2012 2 MAITHE VENDAS GALHARDO DESEMPENHO DO CÁLCULO DE RISCO PARA PRÉ- ECLÂMPSIA NO PRIMEIRO TRIMESTRE POR MEIO DO SOFTWARE DISPONIBILIZADO PELA FETAL MEDICINE FOUNDATION (FMF). Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Saúde e Desenvolvimento na Região Centro-oeste da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, para obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Ernesto Antônio Figueiró Filho CAMPO GRANDE 2012 3 MAITHE VENDAS GALHARDO DESEMPENHO DO CÁLCULO DE RISCO PARA PRÉ- ECLÂMPSIA NO PRIMEIRO TRIMESTRE POR MEIO DO SOFTWARE DISPONIBILIZADO PELA FETAL MEDICINE FOUNDATION (FMF). Disserta ção apresentada ao Programa de Pós-grad uação em Saúde e Desenvo lvimento na Região Centro-oeste da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, para obtenção do título de Mestre. Resultado ___________________ Campo Grande (MS) 31, de março de 2012. BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. Ernesto Antônio Figueiró Filho Instituição: Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). Prof. Dr. Francisco Maud Filho Instituição: Universidade de São Paulo (USP – Ribeirão Preto). Prof. Dra. Alessandra Cristina Marcolin Instituição: Universidade de São Paulo (USP – Ribeirão Preto). 4 DEDICATÓRIA Aos meus pais, Cezar e Maria Tereza que me propiciaram uma vida digna, repleta de oportunidades, onde eu pudesse crescer, acreditando que tudo é possível. Aos meus irmãos, Cezar Luiz e Cezar Augusto, eternos colaboradores, motivo de orgulho, sempre dispostos a me ajudarem independente da tarefa. Ao meu marido Maurício, companheiro de meus sonhos e minhas ideias. Às pacientes atendidas pelo Setor de Gestação de Alto Risco do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Universitário (HU) da Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), pela grande contribuição oferecida a esse trabalho e a quem também dedico esse fruto de tanto esforço. 5 AGRADECIMENTOS Ao meu orientador Prof. Dr. Ernesto Antônio Figueiró Filho, Chefe da Divisão de Apoio Acadêmico e Científico, Professor do Programa de Pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, atual Coordenador do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos UFMS, pela oportunidade e confiança em mim depositada, pela colaboração, paciência e seus conhecimentos repassados durante todo o desenvolvimento do trabalho, além da grande amizade formada. Ao Prof. Dr. Francisco Mauad Filho, professor colaborador da pós-graduação da Universidade de São Paulo e entre tantos outros trabalhos de destaque no meio acadêmico. Fez de mim uma apaixonada pela ultrassonografia, sendo o principal responsável por esse direcionamento da minha carreira, a quem tenho imensa admiração não só pela sua capacidade técnica, por sua experiência e habilidade de transmitir conhecimento, por sua trajetória de vida, mas principalmente por seu dom nato de aproximar pessoas, unir forças em torno de um ideal maior. Sua influencia foi além do contexto acadêmico, ficando para o resto de minha vida em meu coração como um grande espelho de conduta reta e honesta, em todos os sentidos. A Dra. Alessandra Pucci Mantelli Galhardo que engrandeceu esse estudo, com sua experiência e obsessão perspicaz e pelo apoio a mim dispensado no decorrer desse trabalho. Dra. Vanessa Marcon, pela forma atenciosa, cuidado e rapidez na correção desse trabalho. Pela disposição em colaborar e pelas valiosas sugestões. Ao acadêmico da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Bruno Areco de Souza, um colaborador prestativo e uma promessa no meio acadêmico. 6 RESUMO Galhardo MV. Desempenho da Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia disponibilizado pela Fetal Medicine Foundation (FMF) associado à ultrassonografia de primeiro trimestre para triagem de pré-eclâmpsia em gestantes. Campo Grande;2012. [Dissertação – Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul]. Segundo as diretrizes da Associação Médica Brasileira, em relação à assistência pré-natal, ficou estabelecido que o número mínimo de consultas nesse período deverá ser seis, sendo uma no primeiro trimestre, duas no segundo e três no último trimestre de gestação. O maior número de consultas no final da gravidez se deve à avaliação da gestante em relação ao risco perinatal e aos eventos que geralmente ocorrem nesse período como a pré-eclâmpsia (PE), uma das principais causas de óbito materno. A fisiopatologia da PE ainda não é totalmente esclarecida, sendo considerada como uma patologia de origem multifatorial, para qual aspectos imunológicos, genéticos e ambientais estão associados. A identificação precoce de potenciais gestantes que possam desenvolver PE seria uma ferramenta bastante útil, pois terapias profiláticas poderiam ajudar, e muito, que tais gestações transcorressem com melhores resultados. Sendo assim, esse trabalho se propôs a avaliar o desempenho, em termos de sensibilidade e especificidade, da Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia, disponibilizado pela Fetal Medicine Foundation (FMF) na triagem de gestantes que estão no primeiro trimestre de gravidez, utilizando o ultrassom na avaliação quanto ao risco à PE (precoce, intermediária e tardia), sem marcadores séricos. Para tanto, os dados de 195 gestantes, obtidos por meio de questionário, ultrassonografia de primeiro trimestre e pressão arterial media foram submetidos ao teste em questão para cálculo do risco à PE. O padrão de referência considerado foi a confirmação do desenvolvimento real de PE, nos três estágios descritos. Os cálculos de desempenho do teste foram feitos utilizando-se o Prism 5® para Windows, admitindo um nível de significância de 0,05 e também processados graficamente (Curvas ROC). Os resultados demonstraram sensibilidade maior para o risco à PE tardia (85,7%), comparada à precoce (75%) e à intermediária (80%), com especificidade de 82,4% (PE tardia), 91,2% para intermediária e 98,2% para precoce. Pode-se concluir, então, que para o primeiro trimestre de gestação, a Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia da (FMF) foi um instrumento útil e aplicável na avaliação do risco à PE calculado em gestantes brasileiras. Palavras-chave: pré-eclâmpsia, ultrassonografia, pré-natal, sensibilidade e especificidade. 7 ABSTRACT Galhardo MV. Performance Risk Calculator Preeclampsia is available by the Fetal Medicine Foundation (FMF) associated with first-trimester ultrasound screening for pre-eclampsia. Campo Grande;2012. [Dissertação – Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul]. According to the Brazilian Medical Association guidelines regarding prenatal care, it is established that the minimum number of queries in this period should be six, one in the first quarter, two in the second quarter and three in the last trimester of pregnancy. The largest number of consultations in late pregnancy is due to the evaluation of pregnant women in relation to perinatal risk and events that usually occur during this period as preeclampsia (PE), a leading cause of maternal death. The pathophysiology of PE isn't fully understood yet, being regarded as a multifactorial origin pathology, for which immunological, genetic and environment aspects, are associated. The precocious identification of potential pregnant women who might develop PE could be a very useful tool, because prophylactic therapy could help, a lot, such pregnancies development with better results. Thus, this study aimed to evaluate the performance, in terms of sensitivity and specificity, the Preeclampsia Risk Calculator available by the Fetal Medicine Foundation (FMF) to screen pregnant women who are in the first trimester of pregnancy, using ultrasound in the evaluation about the risk of PE (early, intermediate and late), without serum markers. Therefore, the data of 195 pregnant women, obtained by questionnaire, routine ultrasound exams on the first quarter and medium arterial pressure were tested with this method for calculation of PE risk. The considered reference standard was the confirmation of PE actual development in the three described stages. Performance calculations tests were performed using the Prism5® for Windows, assuming a significance level of 0.05 and also graphically processed (ROC curves). Results showed greater sensitivity just to late PE risk (85.7%) compared to early (75%) and intermediate (80%), with specificity of 82.4% (late PE), 91.2% for intermediate and 98.2% for early. We can conclude, then, that for the first trimester of pregnancy, the Risk Calculator for Preeclampsia (FMF) was a useful tool and applicable in the assessment of PE calculated risk in Brazilian pregnant women. Keywords: preeclampsia, ultrasonography, prenatal, sensitivity and specificity. 7 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÁO........................................................................................................08 2 REVISÃO DE LITERATURA..................................................................................10 2.1 Pré-eclâmpsia.....................................................................................................10 2.2 Etiopatogenia da pré-eclâmpsia.......................................................................11 2.3 Critério diagnóstico e classificação da pré-eclâmpsia..................................15 2.4 Variação do Doppler das artérias uterinas ao longo da gestação e no rastreamento para pré-eclâmpsia.............................................................15 3 OBJETIVOS............................................................................................................20 4 MATERIAL E CASUÍSTICA...................................................................................21 4.1 Tipo de pesquisa e local de realização............................................................21 4.2 Consentimento...................................................................................................21 4.3 Casuística...........................................................................................................22 4.3.1 Critérios de inclusão.........................................................................................22 4.3.2 Critérios de exclusão........................................................................................22 4.4 Métodos..............................................................................................................24 4.4.1 Aplicação do questionário.................................................................................24 4.4.2 Exame ultrassonográfico..................................................................................25 4.4.2.1 Comprimento Cabeça-Nádega (CCN)...........................................................26 4.4.2.2 Doppler das artérias uterinas e Índice de Pulsatilidade (IP)..........................27 4.4.3 Medição da Pressão Arterial Média (PAM).......................................................29 4.4.4 Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia, de acordo com a Fetal Medicine Foundation (FMF) e categorização das gestantes quanto ao risco à PE......................................................................................................................30 4.4.5 Análise estatística.............................................................................................32 5 RESULTADOS.......................................................................................................33 6 DISCUSSÃO..........................................................................................................41 7 CONCLUSÕES......................................................................................................44 REFERÊNCIAS.........................................................................................................45 8 1 INTRODUÇÃO De acordo com a World Health Organization (WHO) em 2005, a pré- eclâmpsia (PE) é uma das principais causas de morbimortalidade materna e perinatal, afetando cerca de 2,0% das gestações no mundo. Já na América Latina, a PE é responsável por 26,0% das mortes maternas, sendo possível observar uma tendência à elevação dessa prevalência, como consequência de alterações nas características das gestantes (aumento da obesidade, hipertensão crônica, diabetes e idade materna), além da redução da mortalidade por outros motivos, como infecção e hemorragia (STEEGER et al., 2010). Quanto às repercussões fetais, a prematuridade é uma das complicações mais frequentes da PE, responsável pela grande parte da ocupação dos leitos de UTI neonatal, o que configura um grande problema de saúde pública (OLIVEIRA; KIMURA, 2008). A classificação de mulheres com alto risco ao desenvolvimento da PE é o principal objetivo do pré-natal de rotina. Durante esse acompanhamento, procura-se identificar gestantes que tenham probabilidade de desenvolver a PE, o que é favorecido dentre mulheres da raça afro-caribenha, nulíparas, que possuam elevado índice de massa corporal (IMC) e história pessoal ou familiar de PE (YU et al., 2005). A história materna, quando avaliada isoladamente, apresenta baixa sensibilidade à identificação de gestantes quanto ao risco à PE, não sendo, portanto, um bom método de screening. A predição da PE precoce e da PE tardia, quando apenas esse quesito é considerado, é de 47% e 41% respectivamente, com falso positivo de 10 % para ambas (POON et al., 2009). Em relação ao uso do Doppler das artérias uterinas no segundo trimestre, Harrington et al. (1996) observaram que sua utilização é consagrada e amplamente difundida na prática clínica procurando avaliar a presença ou ausência de incisura 9 (notch). Quando essa característica é observada a partir de 24 semanas bilateralmente nas artérias uterinas, aventa-se um risco maior que 80% para pré- eclâmpsia precoce. Avanços científicos dos últimos anos são direcionados no sentido de tornar possível a triagem dos grupos de risco para diversas patologias da gestação, por meio de ultrassom de primeiro trimestre. Dessa forma, fica mais fácil oferecer às pacientes identificadas nesses grupos, um seguimento diferenciado no pré natal, promovendo uma gestação saudável (NICOLAIDES, 2011). No caso específico da PE, recentemente tem sido demostrado que a intervenção farmacológica com aspirina, quando iniciada no primeiro trimestre, pode reduzir a prevalência de PE nos grupos de risco, ressaltando a importância da identificação precoce dessas mulheres (BASCHAT et al., 2009; BUJOLD et al., 2010). Com base nessa tendência, a Fetal Medicine Foundation(FMF) desenvolveu uma calculadora de risco para pré-eclâmpsia (Risk Calculator for Preeclampsia), aplicável no primeiro trimestre, associando fatores de risco maternos, pressão arterial média e ultrassom com Doppler realizado no primeiro trimestre para determinação do Índice de Pulsatilidade (IP) das artérias uterinas. Portanto, espera-se que o desempenho desse instrumento idealizado pela FMF seja suficiente para que gestantes com risco à PE sejam identificadas no primeiro trimestre, quando a intervenção surte melhores resultados. A associação desse teste ao ultrassom realizado entre a 11ª e a 13ª semanas de gravidez tornaria o método mais acurado, trazendo maiores benefícios, já que outras patologias poderiam também ser avaliadas. É com base nesses aspectos que esse estudo se justifica. 10 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Pré-eclâmpsia A pré-eclâmpsia (PE) é uma doença multisistêmica exclusiva da gravidez, caracterizada por hipertensão e proteinúria e que se desenvolve após 20 semanas de gestação (AKOLEKAR et al., 2011; ISMAIL; HIGGINS, 2011). Acredita-se que em cerca de 2 a 10% de todas as gestações a PE se desenvolva, configurando-se como uma importante causa de morbidade e mortalidade materna e perinatal (KAHN et al., 2009; CANTWELL et al., 2011; ISMAIL; HIGGINS, 2011; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011). As gestantes com PE apresentam também maior risco de resultados adversos na gravidez, como o parto pré-termo, restrição de crescimento fetal, descolamento prematuro de placenta e morte fetal. Além disso, a PE é responsável por aproximadamente um terço de todos os óbitos maternos (DAVIS; DUNLOP, 1983; BARTON; SIBAI, 2008). No tocante às repercussões fetais e neonatais, a prematuridade é uma das complicações mais frequentes da PE, em consequência de trabalho de parto espontâneo ou por conduta obstétrica de interrupção da gravidez, decorrente do comprometimento materno e fetal, como observado por Chain, Oliveira e Kimura em 2008. Estudos que investigaram a associação entre hipertensão na gravidez e parto pré-termo evidenciaram que as doenças hipertensivas da gravidez podem aumentar a incidência de nascimento prematuro. Dependendo da gravidade da doença, a prematuridade pode variar de 3,9% a 14,1%. Nota-se também, que grávidas hipertensas têm maior necessidade da indução do trabalho de parto na 36ª semana de gestação (HABLI et al., 2007; YE et al., 2010). 11 Segundo observações de Habli et al. (2007), recém nascidos, frutos do parto pré-termo, geralmente necessitam de cuidados intensivos. Nesse sentido, um estudo revelou que em 156 casos de mães que desenvolveram pré-eclâmpsia, cujos partos ocorreram entre a 35ª e a 37ª semanas de gestação, 33% dos bebês precisaram permanecer na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, por cerca de 3 a 10 dias. No Brasil, uma análise feita sobre as causas da prematuridade revelou que a PE foi responsável por 38% dos nascimentos pré-termo, sendo considerado o grupo de maior risco para prematuridade as mulheres que receberam tratamento anti- hipertensivo, provavelmente por serem os casos mais graves (SILVEIRA et al., 2010). 2.2 Etiopatogenia da pré-eclâmpsia A causa da pré-eclâmpsia (PE) permanece desconhecida. As principais hipóteses descrevem a PE como um distúrbio da função placentária no início da gestação. Uma remodelação prejudicada da artéria espiralada tem sido considerada uma alteração precoce, mas não necessariamente o defeito primário que causa a PE (BROSENS et al., 1972). De acordo com Pijnenborg et al. (2006), a remodelação é um processo seriado no qual a primeira etapa da decídua deve ser iniciada em torno da implantação. Distúrbios nesta fase poderiam aumentar o risco à PE. Além disso, é preciso lembrar que o feto representa um corpo estranho para o organismo materno, devido à presença da carga genética paterna, mas é a placenta que entra em contato direto com o sangue materno e deve, assim, ser tolerada por seu sistema imune. Dessa forma, a primeira fase da PE é representada por uma quebra de tolerância, na qual a interação do trofoblasto com os leucócitos deciduais gera, entre outras alterações, inadequada produção de citocinas e quimiocinas que tornam a interface materno-fetal imprópria para o desenvolvimento normal da gravidez (MOFFETT; HIBY, 2007). 12 Seguindo a quebra de tolerância e ainda no primeiro trimestre de gestação, Lash et al. (2006) lembraram que a segunda fase de desenvolvimento da doença tem início quando o trofoblasto extraviloso não desempenha normalmente suas funções e não invade adequadamente o terço interno da parede uterina. Na gestação normal, o trofoblasto extraviloso atinge as arteríolas espiraladas miometriais, já em torno de 6 a 8 semanas de gravidez promovendo, nesse momento, verdadeira obstrução do fluxo sanguíneo que banha os espaços intervilosos. Essa forma de desenvolvimento permite que a gravidez se desenvolva em um ambiente hipóxico, protegendo as células fetais do excessivo aporte de O2 (RED-HORSE et al., 2004). À medida que a gestação progride, o trofoblasto extraviloso promove um estresse oxidativo, inflamação e disfunção endotelial. O desarranjo da camada muscular das arteríolas espiraladas uterinas assume características de células endoteliais, substituindo a camada endotelial desses vasos. Quando todo esse processo se dá de forma adequada, ocorre o relaxamento e maior complacência das artérias uterinas, que se tornam capazes de fornecer suprimento sanguíneo uteroplacentário ao longo da gravidez (DE OLIVEIRA et al., 2010). Não se sabe ao certo a razão pela qual o trofoblasto não consegue desempenhar adequadamente suas funções de invasão e remodelamento dos vasos uterinos. Mas é indiscutível que alterações imunológicas são determinantes nesse sentido (MOFFETT, 2002; LASH et al., 2006; PARHAM, 2004). Interações de populações distintas de leucócitos na interface materno-fetal, em especial com células natural killers uterinas e macrófagos, devem ocorrer de forma harmônica para que seja criado um ambiente favorável à tolerância imunológica (DE OLIVEIRA et al., 2010). Uma redução na porcentagem de células T reguladoras em pacientes com PE leva à maior ativação de linfócitos e, consequentemente, à maior resposta inflamatória. Pode-se dizer, então, que a quebra de tolerância materno-fetal ou 13 materno-placentária pode levar à placentação deficiente, à resposta inflamatória e, por conseguinte à PE (BURTON et al., 2009). A invasão trofoblástica deficiente implica em mau controle da oxigenação do espaço interviloso na fase inicial da gravidez e na persistência das características primárias das artérias uterinas espiraladas, as quais mantêm sua elevada resistência. Nesses casos, o sangue banha as vilosidades coriônicas de forma que o fluxo útero-placentário se torne intermitente e de alta pressão, simulando o que acontece em casos de lesão por isquemia e reperfusão (CINDROVA-DAVIES, 2009). O tecido placentário, principalmente o sinciciotrofoblasto, possui capacidade antioxidativa reduzida. Diante disso, as alterações na maneira com a qual o sangue perfunde o espaço interviloso provocam o desenvolvimento do que se caracteriza como estresse oxidativo. O sincício, então, passa a apresentar maior atividade de apoptose e necrose, liberando na circulação materna grande quantidade de material sincicial, fatores antiangiogênicos e debris. Todas essas moléculas provocam ativação de leucócitos sistêmicos, geram estímulos para maior adesão plaquetária, vasoconstrição e resposta inflamatória generalizada. As partículas derivadas do processo necrótico estimulam a produção de citocinas inflamatórias por monócitos circulantes, participando ativamente do desencadeamento e da manutenção da resposta inflamatória na PE (DERZSYet al., 2010). Características como a elevada permeabilidade vascular, a presença sérica de fatores relacionados à injúria endotelial, como por exemplo, a fibronectina, o fator VIII e a trombomodulina, além da elevada reatividade vascular na PE, corroboram as hipóteses dos autores supracitados. As micropartículas sinciciais que atuam no desenvolvimento da resposta inflamatória da PE também são capazes de lesar diretamente o endotélio e promover ativação de neutrófilos (REDMAN; SARGENT, 2008). 14 AV - Vilo aderido GL - Glândula COE - Cavidade celomática IS - Espaço interviloso CY - Citotrofoblasto JZ - Zona juncional miometrial DB - Decídua basal MB - Sangue materno DC - Decídua capsular MV - Veia materna DP - Decídua parietal SA - Artéria espiralada EN - Endotélio SM - Músculo liso da artéria ET - Trofoblasto extraviloso ST - Estroma FB - Sangue fetal TM - Túnica média FV - Vilo livre UC - Cavidade Uterina Figura 1 – Possíveis processos fisiopatológicos na pré-eclâmpsia, adaptado de Steegerset al. (2010) Resumidamente, de acordo com Walsh (1990), os dois principais mecanismos fisiopatológicos da PE seriam ausência da segunda onda de invasão trofoblástica nas paredes das artérias espiraladas (impedindo o aumento do fluxo sanguíneo), associada a um desequilíbrio entre a produção de tromboxano e de prostaciclina, a favor da ação biológica do tromboxano na circulação placentária. Conforme observado por Poon et al. em 2010, algumas características maternas podem ser consideradas como fatores de risco para o desenvolvimento da PE, dentre elas, a raça (a maior prevalência de PE é em mulheres negras), a hipertensão crônica que exige medicação anti-hipertensiva, histórico de PE em gestações anteriores, gravidezes após indução da ovulação, maior IMC e história materna e de PE. 15 2.3 Critério diagnóstico e classificação da pré-eclâmpsia O critério diagnóstico de pré-eclâmpsia (PE) consiste na presença de pressão arterial acima de 140/100 mmHg em duas ou mais aferições e proteinúria superior a 300 mg/24 h (STEEGERS et al., 2010; World Health Organization, 2011). Quanto à classificação da PE, Akolekar et al. (2011) consideraram o período no qual ela se desenvolveu, durante a gestação, em sua pesquisa. Se esse desenvolvimento ocorreu e houve exigência do parto antes de 34 semanas, a PE foi definida como precoce. Se, no entanto esse quadro se deu entre a 34ª e 37ª semanas, a PE foi considerada como intermediária e, finalmente, gestantes que desenvolveram PE que exigiu a interrupção da gravidez após 37 semanas, tiveram a PE classificada como tardia. 2.4 Variação do Doppler das artérias uterinas ao longo da gestação e no rastreamento para pré-eclâmpsia. Até a 10ª semana de gestação as artérias uterinas apresentam fluxo com padrão monofásico, semelhante ao da segunda fase do ciclo menstrual, demonstrando um pico sistólico alto, com incisura protodiastólica moderada e diástole baixa. A queda do índice de resistência (IR) no início da gestação é baixa e não significante em comparação à segunda fase do ciclo menstrual (BONILHA- MUSSOLES; BALLESTER, 1992). O IR e o Índice de Pulsatilidade (IP) decrescem ao longo do primeiro trimestre, com padrões semelhantes aos do período pré-gravídico e permanecem assim até a 10ª semana. A partir de então, observa-se uma redução gradativa na resistência e no desaparecimento da incisura (ZANFORLIN FILHO, 1997). Com o objetivo de avaliar as artérias uterinas, Costa et al. em 2006 conduziram um estudo prospectivo, considerando 4 fases da gestação: de 18 a 20 semanas, de 24 a 26, de 28 a 30 e de 34 a 36 semanas. Os autores demonstraram a importância da realização do estudo por Doppler dessas artérias, mesmo em 16 populações de baixo risco, enfatizando que a melhor época para a sua realização é entre 24 e 26 semanas, nas quais a presença de incisura bilateral e os índices de impedância são elevados. 10 semanas 16 semanas 1ª onda 2ª onda Figura 1 – Alteração da artéria uterina ao longo da gestação normal, Galhardo 2012 Plasencia et al. em 2007 determinaram o desempenho do rastreio para a pré- eclâmpsia em gestações únicas durante o pré-natal de rotina, por meio da avaliação das características maternas e do índice de Pulsatilidade (IP) das artérias uterinas no primeiro trimestre (11 + 0 -13 + 6 semanas). Foram avaliados 6015 casos, sendo que 107 (1,8%) desenvolveram PE, 760 (12,6%), desenvolveram hipertensão gestacional sem alterar o crescimento fetal e 5041 (83,8%) casos não foram afetados pela PE ou por hipertensão gestacional. Na previsão de PE, contribuições significativas foram fornecidas pelo IP das artérias uterinas, além da análise dos fatores maternos como origem étnica, índice de massa corporal e história pregressa e familiar de PE. Para uma taxa de falso positivo de 10%, a inclusão do IP das artérias uterinas elevou a sensibilidade para detecção da PE precoce para 61,7% e 81,8% para a PE tardia. Onwudiwe et al. (2008) realizaram um estudo com 3529 gestantes, a fim de desenvolverem um screening para PE, combinando a história materna, a pressão arterial e o Doppler das artérias uterinas. As pacientes tinham idade gestacional entre 22 e 24 semanas. Após análise dos dados, os autores demonstraram que o 17 rastreamento feito com base somente nas características maternas foi capaz de identificar apenas cerca de 30% das gestações passíveis de desenvolver a PE, a uma taxa de falsos positivos de 10%. A abordagem mais eficaz foi a combinação da história materna, medição de pressão arterial e IP das artérias uterinas, já que o acréscimo do IP implicou numa taxa de detecção de PE precoce e tardia respectivamente de 95,7% e 41,0%, com uma taxa de falsos positivos de 10%. Em 2011, Akolekar et al. realizaram um estudo em 32850 grávidas que estavam entre a 11ª e a 13ª, com intuito de realizar um screening para PE no primeiro trimestre. Os dados utilizados foram IP, média da pressão arterial, história prévia de PE e marcadores biológicos. A sensibilidade ao se considerar apenas os aspectos maternos, foi de 33,0% para os casos de PE precoce, 27,5% para PE intermediaria e 24,5% para PE tardia, com uma taxa de 5% de falsos-positivos. Quando associados os dados maternos aos obtidos por meio dos marcadores bioquímicos e biofísicos, a detecção da PE precoce foi da ordem de 91,0%, 79,4% para PE intermediária e 60,9% para PE tardia. Os autores concluíram que os fatores maternos associados à ultrassonografia com IP das artérias uterinas e marcadores bioquímicos tornou possível o rastreamento no período entre a 11ª e a 13ª semanas, aumentando consideravelmente sua sensibilidade e especificidade. A associação entre o exame de ultrassonografia, considerando o IP das artérias uterinas, e a calculadora de risco da Fetal Medicine Foundation (FMF) no primeiro trimestre de gestação (entre 11 e 13 semanas) é um método válido como rastreamento de pacientes com possibilidade de desenvolver PE. Essa observação foi feita por Poon et al. em 2009, depois de aplicarem essas duas ferramentas num estudo que incluiu 8061 gestantes. Espinoza et al. (2010) realizaram um estudo com 4.190 gestações únicas, submetidas a exame ultrassonográfico entre a 23ª e a 25ª semana. O Índice de Pulsatilidade (IP) e o Índice de Resistência (IR) de ambas as artérias uterinas foram calculados. A presença ou ausência da incisura bilateral nessas artérias também foi analisada. Após análise dos resultados, os autores concluíram que a incisura bilateral das artérias uterinas é um fator de risco independente para o desenvolvimento de PE precoce e da hipertensão gestacional. 18 Para avaliar a importância do Doppler das artérias uterinas no primeiro trimestre na predição de risco para PE, Fratelli et al. em 2008 consideraram anormal a presença de incisura bilateral ou um Índice de Resistência (IR) maior que 0,80 dessas artérias. Os autores avaliaram 76 gestantes de alto risco e observaram que, quando o IR era normal nas artérias uterinas, a gestação era fortemente relacionada a uma evolução normal, ainda que as mulheres fossem consideradas como de alto risco para a PE. Segundo Napolitano et al. (2010), não há diferença na predição do risco à PE, considerando os valores médio, maior e menor do Índice de Resistência (IR) das artérias uterinas. Os autores chegaram a essa conclusão ao analisarem os exames de Doppler das referidas artérias de 24.859 gestantes que estavam entre a 18a e 23a semana de gravidez, num estudo retrospectivo e observacional, cujos dados foram analisados segundo a Receiver Operating Characteristic (Curva ROC). Com o objetivo de avaliar a importância dos valores (menor, médio e maior) do Índice de Pulsatilidade (IP) das artérias uterinas no primeiro trimestre de gestação para predição do risco à PE, Napolitano et al. em 2011 analisaram 6221 gestações únicas. O IP das artérias uterinas foi obtido durante a ultrassonografia realizada no período entre a 11ª e a 14ª semana, sendo os dados submetidos à Curva ROC. Houve 178 casos de PE, nesse estudo. Os resultados demonstraram uma associação mais relevante entre o IP das artérias uterinas e o desenvolvimento da PE precoce. Não houve relação significativa entre o valor do IP, sendo ele menor, médio ou maior, e o desenvolvimento da PE. Em 2011, Poon et al. examinaram o desempenho do rastreamento do risco à PE utilizando a história materna e a pressão arterial sistólica, diastólica e média em gestantes que estavam entre a 11ª e a 13ª semana de gravidez. Foram avaliadas 9149 mulheres, sendo que 8061 delas não desenvolveram PE. As pressões foram aferidas de forma padronizada, em todas as gestantes, com esfigmomanômetro automático, calibrado periodicamente durante o estudo. Após análise dos dados, os autores concluíram que aliar os dados maternos às medidas de pressão arterial possibilita o rastreamento de mulheres à PE. 19 3 OBJETIVOS 3.1 Geral Avaliar o desempenho da Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia disponibilizada pela Fetal Medicine Foundation (FMF), associada ao ultrassom de primeiro trimestre (11-13 semanas) no cálculo do risco para pré-eclâmpsia em mulheres brasileiras. 3.2 Específicos A) Estimar o melhor ponto de corte para predição de pré-eclâmpsia precoce utilizando a Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia (FMF) e o ultrassom de primeiro trimestre. B) Estimar o melhor ponto de corte para predição de pré-eclâmpsia intermediária utilizando a Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia (FMF) e o ultrassom de primeiro trimestre. C) Estimar o melhor ponto de corte para predição de pré-eclâmpsia tardia utilizando a Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia (FMF) e o ultrassom de primeiro trimestre. 20 4 MATERIAL E CASUÍSTICA Essa pesquisa seguiu os padrões exigidos para condução de estudos de acurácia diagnóstica preconizados pela iniciativa STARD (Standards for Reporting of Diagnostic Accuracy), descritos por Bossuyt et al. (2003). 4.1 Tipo de pesquisa e local de realização Trata-se de um estudo de acurácia, retrospectivo, com pacientes assistidas pelo Setor de Gestação de Alto Risco do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Universitário (HU) da Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). O período de coleta de dados ocorreu entre outubro de 2010 e maio de 2011. 4.2 Consentimento Todas as pacientes receberam informações acerca do estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) (Apêndice A) que, juntamente com o projeto de pesquisa, foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (Anexo A). 21 4.3 Casuística 4.3.1 Critérios de inclusão  Gestantes entre 11 e 13 semanas e 6 dias (fetos com comprimento cabeça- nádega - CCN - entre 45-84 mm).  Gestantes que aceitaram participar da pesquisa, assinando o TCLE.  Gestantes com seguimento pré-natal regular no Ambulatório de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Universitário da FAMED/UFMS. 4.3.2 Critérios de exclusão Gestantes com idade inferior a 18 anos, indígenas, deficientes mentais, com gestação gemelar, idade gestacional inferior a 11 semanas e 6 dias ou superior a 13 semanas e 6 dias ou que se recusaram a participar do estudo. 22 Pacientes elegíveis n = 200 Pacientes excluídas (n = 5) < 18 anos: n = 2 Indígena: n = 1 Pacientes avaliadas (n = 195) Gemelar: n = 2 Ultrassom (11-14 semanas) + Teste índice Cálculo de risco (FMF website) Risco à PE > 3,0% Risco à PE < 3,0% n = 64 (33,0%) n = 131 (67,0%) P recoce Intermediária Tardia (< 34 semanas) (34-37 (> 37 semanas) semanas) n = 12 (6,0%) n = 35 (18,0%) n = 17 (9,0%) Desenvolvimento de PE (n = 195) P ressão sanguínea > 140 x 100 mmHg + Padrão de referência P roteinúria > 300 mg/24 h Confirmado Não confirmado n = 24 (12,0%) n = 24 (12,0%) Pre coce Intermediário Tardia (< 34 se manas) (34-37 semanas) (> 37 semanas) n = 12 (6,0%) n = 5 (2,5%) n = 7 (3,5%) Figura 1 – Fluxograma das participantes e desenho do estudo, onde: FMF: Fetal Medicine Foundation PE: Pré-ec lâmpsia 23 4.4 Métodos Assim que as gestantes eram admitidas para a pesquisa, o risco de desenvolver à pré-eclâmpsia (PE) era calculado, segundo o instrumento Risk Calculator for Preeclampsia, disponibilizado pela Fetal Medicine Foundation (FMF), disponibilizado gratuitamente no site: https://courses.fetalmedicine.com/calculator/pe?locale=en. Para tanto, alguns dados foram coletados por meio de questionário (Apêndice B) e outros obtidos a partir do exame ultrassonográfico (idade gestacional, comprimento cabeça-nádega ou CCN do feto e Índice de Pulsatilidade ou IP das artérias uterinas esquerda e direita). Foi realizada também a aferição da pressão arterial média (PAM) de ambos os braços, conforme orientações da FMF especificadas no site citado acima. A seguir, todos esses procedimentos serão descritos. 4.4.1 Aplicação do questionário Todas as gestantes responderam um questionário (Apêndice B) para a coleta de alguns dos dados necessários ao cálculo do risco à PE, segundo o Risk Calculator for Preeclampsia da FMF. Essas informações eram: idade, peso, altura, raça, presença de diabetes tipo I, hipertensão crônica, lúpus, histórico familiar de PE e tabagismo durante a gestação. Também foi investigado o método de concepção (espontâneo, fertilização in vitro ou indução à ovulação) e a história obstétrica (com ou sem PE) ou nuliparidade. 24 4.4.2 Exame ultrassonográfico Os exames de ultrassom foram realizados em todas as gestantes no primeiro trimestre, por via abdominal, visando datar a gravidez, confirmar a idade gestacional pela medição do comprimento cabeça-nádega (CCN) e calcular o Índice de Pulsatilidade (IP) das artérias uterinas esquerda e direita, por meio do Doppler. Apenas um único operador executou todos esses exames, o que eliminou a variabilidade inter observador, sendo este devidamente certificado pela Fetal Medicine Foundation (Anexo E), comprovando sua competência na verificação das imagens relacionadas à gestação de 11-13 semanas e na realização do ultrassom com Doppler. Todos os laudos, referentes às ultrassonografias foram entregues às gestantes para que realizassem seu seguimento pré-natal. Os referidos exames foram feitos num equipamento Toshiba Nemio 17/SSA- 550A® (Toshiba Systems, Japan), utilizando-se o transdutor convexo multifrequencial 2-5 MHz. ® Figura 2 – Toshiba Nemio 17/SSA-550A (Toshiba Systems, Japan). 25 4.4.2.1 Comprimento Cabeça-Nádega (CCN) Depois de ter comprovado que a idade gestacional estava dentro dos critérios de inclusão para esse estudo, verificou-se o Comprimento Cabeça-Nádega (CCN) do feto, um dos quesitos que compõem as variáveis consideradas no cálculo de risco à PE, segundo a Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia da Fetal Medicine Foundation (FMF). Figura 3 – Exemplo de uma das imagens obtidas no estudo, demonstrando a medida CCN do feto. 26 4.4.2.2 Doppler das artérias uterinas e Índice de Pulsatilidade (IP) Todos os critérios utilizados para se calcular o Índice de Pulsatilidade (IP) das artérias uterinas foram os preconizados pela Fetal Medicine Foundation (FMF), sendo pré-requisito que a idade gestacional estivesse entre a 11ª e 13ª semanas e os fetos possuíssem CCN entre 45-84mm. A técnica para correta visualização das artérias uterinas, por via abdominal, consiste em se obter um corte sagital do útero, identificando o canal cervical e seu orifício interno. O transdutor foi inclinado para ambos os lados, quando um mapa de cor para identificação de cada artéria uterina foi aplicado (1cm medial ao ponto de cruzamento). Depois, o Doppler pulsátil foi utilizado para que se obtivessem as imagens de boa qualidade de 3 ondas consecutivas de velocidade de fluxo (OVF), com uma amostra de 2mm. O ângulo de insonação utilizado foi inferior a 30º, calculando-se, assim, o IP. Durante esse exame, a paciente permaneceu numa posição semideitada. Quando três formas de onda semelhantes consecutivas eram obtidas, o IP e o pico de velocidade sistólica (PSV) eram medidos (não se admitindo valor menor que 60 cm/s). Foram calculados o IP médio das artérias direita e esquerda. Medidas menores indicavam que um vaso errado tinha sido examinado. 27 Figura 4 – Exemplo de uma das imagens obtidas no estudo, onde é visualizado o Doppler das artérias uterinas. Figura 5 – Relação entre os parâmetros da onda de velocidade (OVF) e os índices Doppler. IR: Índ ice de Resistência IP: Índice de Pulsatilidade A: Pico sistólico B: Final da Diástole C: Inici o da Diástole D: Máximo da Diástole Costa et al. (2006) 28 4.4.3 Medição da Pressão Arterial Média (PAM) A aferição da Pressão Arterial Média (PAM) também seguiu a técnica recomendada pela Fetal Medicine Foundation (FMF) descrita abaixo: Foram utilizados esfigmomanômetros automáticos Microlife 3 3BTO-A® (Microlife, Taiwan) (Figura 5), calibrados previamente ao início da pesquisa e em intervalos regulares durante o curso da mesma. O tamanho apropriado do manguito foi selecionado de acordo com a circunferência média do braço da paciente: pequena (<22cm), normal (entre 22- 32cm) ou grande (entre 33-42cm). A pressão foi aferida em ambos os braços simultaneamente, com as pacientes na posição sentada e com os braços apoiados no nível do coração. Após repouso de 5 minutos da paciente, a pressão sanguínea era aferida e uma série de registros foi efetuada com intervalos de 1 minuto até que as variações entre leituras consecutivas fosse reduzida a no máximo 10mmHg na pressão sistólica e 6mmHg na pressão diastólica (procedimento adotado para ambos os braços). Quando este ponto de estabilidade era alcançado, calculava-se a PAM de cada braço, com a média das duas últimas medições estáveis e, tal como recomendado (FMF), a maior PAM foi considerada no cálculo do risco à PE. Figura 5 – Esfigmomanômetro utilizado na pesquisa e como padrão da FMF. 29 4.4.4 Risk Calculator for Preeclampsia,de acordo coma Fetal Medicine Foundation (FMF)e categorização das gestantes quanto ao risco à PE Obtidos todos os dados necessários para o cálculo do risco à PE, esses eram submetidos ao programa idealizado pelo Centro de Medicina Fetal de Londres, disponibilizado em https://courses.fetalmedicine.com/calculator/pe?locale=en (Figura 6). Figura 6 – Risk Calculator for Preeclampsia, de acordo com a Fetal Medicine Foundation (FMF) 30 O risco teórico de 3,0% para pré-eclâmpsia foi definido para o teste índice (ultrassom + a Calculadora de Risco da FMF), com base nos estudos de Steegers et al. (2010), Ismail e Higgins (2011) e da World Health Organization (WHO) (2011) sobre a prevalência da pré-eclâmpsia em diferentes populações, antes da confirmação de seu real desenvolvimento, evento considerado como padrão de referência nessa pesquisa. As gestantes que demonstraram risco à pré-eclâmpsia maior que 3,0% foram divididas em 3 subgrupos: risco de desenvolver PE precoce (apresentado antes das 34 semanas de gestação), risco de desenvolver PE intermediária (entre 34 e 37 semanas) e risco de desenvolver PE tardia (após 37 semanas de gravidez). O desenvolvimento efetivo da pré-eclâmpsia (padrão de referência) foi confirmado nas mulheres que apresentavam, como critérios de diagnóstico dessa patologia, duas ou mais medidas da pressão arterial superior a 140/100mmHg e proteinúria superior a 300mg/24 h Steegers et al. (2010) e WHO (2011), segundo o registro médico no pré-natal. A classificação do risco à pré-eclâmpsia, nessas gestantes (precoce, intermediário ou tardio), obedeceu às seguintes características: se a gestante desenvolveu PE confirmada e houve a necessidade de realização do parto antes de 34 semanas, esta foi definida como portadora de PE precoce. Já a PE intermediária correspondeu ao desenvolvimento de PE confirmado pelos critérios descritos, com interrupção da gravidez entre 34-37 semanas. Finalmente, as pacientes que tiveram PE confirmada com interrupção da gravidez após 37 semanas fizeram parte do grupo com PE tardia (AKOLEKAR et al., 2011). 31 4.4.5 Análise estatística O desenho do estudo foi delineado no fluxograma exposto (Figura 1). Para os cálculos de sensibilidade e especificidade e para determinar os melhores valores de corte para PE precoce, intermediária e tardia, toda a informação foi processada em curvas ROC. Para criar essas curvas, os valores de risco de pacientes com PE não confirmada (n=171) foram comparados com os valores de risco de pacientes com PE precoce confirmada (n=12), intermediária (n=5) e tardia (n=7) também confirmadas. Para cálculos estatísticos, considerou-se a área sob a curva ROC significativa, para um valor de p menor do que 0,05. As hipóteses consideradas foram:  H0: A Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia (FMF) associado ao exame ultrassonográfico de primeiro trimestre não apresenta boa acurácia no rastreamento da PE precoce, intermediária e tardia.  H1: A Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia (FMF) associado ao exame ultrassonográfico de primeiro trimestre apresenta boa acurácia no rastreamento da PE precoce, intermediária e tardia. O cálculo da Razão de Verossimilhança (RV) e do Intervalo de Confiança (IC) superior a 95% também foram apresentados. Os dados foram submetidos ao software Prism 5® para Windows (Graph Pad Software Inc., 1992-2007). 32 5 RESULTADOS No início da pesquisa, 200 gestantes foram recrutadas para que realizassem o exame de ultrassom de triagem no primeiro trimestre de gravidez, durante o período de outubro de 2010 a maio de 2011. Porém, 5 delas foram excluídas porque não cumpriram os critérios de inclusão. A amostra final avaliada (n=195) correspondeu a 97,5% das mulheres grávidas submetidas à ultrassonografia de triagem durante o período de estudo. A média da idade das pacientes foi de 32 anos (±4,5), sendo a maioria delas brancas (62,5%). O peso médio das gestantes estudadas foi de 64,7Kg (±12,2) e a altura média de 163 ± 0,6cm. A paridade média foi de 1,69 ± 0,9 crianças. A média de idade gestacional ao exame foi de 12 semanas (±0,6) e a média do comprimento cabeça-nádega fetal (CCN) foi de 60,2mm (±9,5). A idade gestacional média no parto foi de 37,4 semanas (±2,4), com recém-nascidos cujo peso médio foi de 3.046g (±515) e altura média de 47,7cm (±3,17). 33 Características – Gestantes Etnia – branca 62,5% Etnia – outra 37,5% Idade (média e DP) 32 (± 4,5) Peso (médio e DP) 64,7 (± 12,2)kg Altura (média e DP) 163 (± 0,6)cm Paridade (média e DP) 1,69 (± 0,9) Diabetes tipo I 2,0% Hipertensão crônica 5,0% Lúpus 0 Tabagismo (gestação) 3,0% Histórico familiar de PE 6,0% Espontânea 95,0% Concepção FIV 2,0% Indução à ovulação 3,0% História Com PE 7,0% obstétrica Sem PE 93,0% Características – Feto Idade gestacional (exame) (média e DP) 12 (± 0,6) semanas CCN (média e DP) 60,2 (± 9,5)mm Idade gestacional ao nascimento (média e DP) 37,4 (± 2,4) Características – Recém-nascidos Peso 3046 (± 515)g Estatura 47,7 (± 3,17)cm Tabela 1 – Características da amostra, onde: PE: Pré-eclâmpsia FIV: Fertilização in vitro CCN: Comprimento Cabeça-Nádega 34 Em relação ao risco à PE, calculado pelo teste índice (ultrassom no primeiro trimestre e Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia, da FMF) das 195 mulheres, 131 (67,0%) não apresentaram esse risco, considerando um ponto de corte menor que 3,0%, enquanto 64 delas (33,0%) demonstraram risco à PE (Gráfico 1). Risco de Pré-eclâmpsia Com risco à PE 33,0% Sem risco à PE 67,0% Gráfic o 1 – Prevalência do risco de pré-eclâmpsia, nas 195 gestantes avaliadas por meio da Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia (The Fetal Medicine Foundation - FMF) e do exame de ultrassonografia de primeiro trimestre (11 a 13 semanas) Dentre as pacientes com risco à PE (64/33,0%) 12 delas (6,0%) foram identificadas com risco precoce, 17 (9%) com risco intermediário e 35 (18,0%) apresentaram risco tardio (Gráfico 2). 35 Risco à pré-eclâmpsia precoce, intermediária e tardia Precoce 6,0% Tardio 18,0% Intermediário 9,0% Gráfico 2 – Prevalência do risco à pré-eclâmpsia, nas 64 gestantes identificadas por meio da Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia ( The Fetal Medicine Foundation - FMF) e do exame de ultrassonografia de primeiro trimestre (11 a 13 semanas), quanto aos estágios precoce, intermediário e tardio A PE realmente foi confirmada em 12,0% da amostra (24/195), sendo que 6,0% (12/195) desenvolveu PE precoce, 2,5% (5/195) PE intermediária e 3,5% (7/195) PE tardia (Gráfico 3). 36 Pré-eclâmpsia Confirmada Tardia 3,5% Precoce 6,0% Intermediária 2,5% Gráfic o 3 – Prevalência do desenvolvimento à pré-eclâmpsia, quanto aos estágios precoce, intermediário e tardio. Sobre o desempenho do índice teste (ultrassom no primeiro trimestre e Risk Calculator for Preeclampsia, da FMF), notou-se uma área significante (p <0,05) sob a curva ROC para risco à PE precoce (0,84 IC95% 0,67 - 1,0), intermediária (0,89 IC95%0,72 - 1,0) e tardia (0,88 IC95% 0,73 - 1,0) como demonstrado na Tabela 2 e Gráficos de 4 a 6. Os instrumentos utilizados identificaram mulheres que possuíam tal risco com maior possibilidade de falso-positivos no período tardio, o que é expresso pelo maior valor de sensibilidade (85,7%). O melhor ponto de corte para avaliar risco à PE correspondeu ao valor maior que 2,1% para risco à PE precoce, superior a 2,5% para a PE intermediária e maior do que 3,5% para a PE tardia (Tabela 2). 37 o Média do risco Risco à PE – 1 Média do risco o o Area sob o o (25 -75 percentis) Melhor trimestre (US + (25 -75 percentis) Sensibilidade Especificidade Curva Pacientes com PE ponto de 95% 95% RV p-valor Calculadora de Pacientes sem PE (IC ) (IC ) ROC confirmada corte (%) 95% Risco - FMF) (%) (IC ) (%) Precoce 0,04 5,0 >2,1 75,0% 98,2% 43, 0,84 <0.0001 (<34 semanas) (0,01-0,14) (0,95-22,0) (42,8-94,5) (94,9-99,6) 0 (0,67-1,0) Intermediária 0,49 12,0 >2,5 80,0% 91,2% 9,1 0,89 0.002 (34-37 (0,1-1,0) (2,2-16,0) (28,3-99,4) (85,9-95,0) 2 (0,72-1,0) semanas) Tardia 1,0 12,0 >3,5 85,7% 82,4% 4,8 0,88 0.0005 (>37 semanas) (0,54-3,0) (4,0-25,0) (42,1-99,6) (75,9-87,8) 9 (0,73-1,0) Tabela 2 – Desempenho da Calculadora de Risco (The Fetal Medicine Foundat ion- FMF) no primeiro trimestre de gravidez para avaliação do risco à pré-eclâmpsia, aliado ao ultrassom, onde: PE: pré-eclâmpsia US: Ultrassom RV: Razão de verossimilhança ROC: Receiver Operating Characteristic FMF: Fetal Medicine Foundation 38 ROC curve: Screening for Early PE (<34sem) with First Trimester Ultrasound (11-13 sem) 100 80 60 40 20 0 0 20 40 60 80 100% - Specificity% Gráfico 4 – Curva ROC para o rastreamento de PE precoce (<34 semanas) ROC curve: Screening for Intermediate PE (34-37sem) with First Trimester Ultrasound (11-13 sem) 150 100 50 0 0 50 100 150 100%-Specificity% Gráfico 5 – Curva ROC para o rastreamento de PE intermediária (34-37 semanas) Sensitivity Sensitivity 39 ROC curve: Screening for Late PE (>37sem) with First Trimester Ultrasound (11-13 sem) 150 100 50 0 0 50 100 150 100%-Specificity% Gráfico 6 – Curva ROC para o rastreamento de PE tardia (> 37 semanas) Resultados Precoce (A) Intermediária (B) Tardia (C) Total de Doentes = 12 5 7 Total de Sadios = 171 171 171 Ponto de corte = (0,02, 0,75) (0,09, 0,80) (0,18, 0,86) Distância (d) = 0,25 0,22 0,23 Área = 0,866 0,856 0,8405 Sens. e Espec. (P. Corte) 0,75 e 1,00 0,80 e 1,00 0,86 e 1,00 Erro padrão = 0,0678 0,1073 0,0943 IC 95% (Área) = 0,7332 a 0,9988 0,6456 a 1,0 0,6556 a 1,0 Sensitivity 40 6 Discussão A avaliação de risco para pré-eclâmpsia (PE) no primeiro trimestre é um tópico novo na avaliação pré-natal. A maioria dos estudos sobre este assunto é datada após 2007 (Plasencia et al., 2007; Poon et al., 2009; Poon et al., 2010; Akolekar et al., 2011). Características maternas associadas a testes bioquímicos e biofísicos no primeiro trimestre de gestação podem rastrear 90% dos casos que irão desenvolver PE precoce, 80% dos intermediários e 60% dos tardios. Com base nesses dados, o site Fetal Medicine Foundation (FMF) criou uma calculadora de risco (Risk Calculator for Preeclampsia) baseada na história materna, na avaliação da pressão arterial e no ultrassom de primeiro trimestre como método de screeening para PE (Akolekar et al., 2011). A questão levantada por essa pesquisa foi, então, se esse instrumento seria útil e aplicável em diferentes populações de gestantes. Diante dos resultados aqui apresentados, pode-se considerar que o teste padrão avaliado (Risk Calculator for Preeclampsia aliado ao ultrassom de primeiro trimestre) é um instrumento adequado para rastrear gestantes com risco à PE, ao se verificar a correlação dos valores dos pontos de corte à Sensibilidade e à Especificidade, dentro da PE precoce, intermediária e tardia. Sendo assim, para a PE precoce, um ponto de corte >2,1% relacionou-se à Sensibilidade de 75% e à Especificidade de 98,2%, enquanto para a PE intermediária, o ponto de corte >2,5% implicou na Sensibilidade de 80,0% e na Especificidade de 91,2%. Já no caso da PE tardia, o ponto de corte >3,5% resultou na Sensibilidade de 85,7% e na Especificidade de 82,4%. Esses resultados permitem direcionar as gestantes que apresentam seu risco calculado acima do ponto de corte para um seguimento diferenciado em seu pré- natal, onde a frequência das consultas e a realização de exames mais complexos seriam concentrados mais precocemente, invertendo o nosso padrão atual no qual o numero de consultas e exames é mais concentrado no terceiro trimestre. A alteração em nosso modelo de pré-natal converge com as atuais tendências de politicas de saúde pública, que busca concentrar seus investimentos nos grupos de risco. 41 A avaliação do risco de pré-eclâmpsia através da calculadora de risco do primeiro trimestre deve ser encorajado. O método aqui avaliado é de baixo custo e aplicável rotineiramente no acompanhamento pré-natal, necessitando de um aparelho de ultrassonografia, um ultrassonografista habilitado e acesso a internet. Cabe ainda lembrar que nesse período é realizar um calculo confiável da idade gestacional, a avaliação da translucência nucal, bem como o screening de outras patologias. Verificou-se uma prevalência elevada de casos confirmados de PE (12%, 24/195), sendo 6,0% (12/195) representados pela PE precoce, 2,5% (5/195) pela PE intermediária e 3,5% (7/195) pela PE tardia, valores significativamente mais altos em comparação com estudos como o de Akolekar et al. (2011), nos quais as taxas de PE eram 0,3%, 0,6% e 1,3%, respectivamente para PE precoce, intermediária e tardia. A explicação para essa alta prevalência seria o fato de que apesar de as participantes desse estudo serem recrutadas de pré-natais de rotina, o estudo se deu em um centro de referência para tratamento de gestantes de alto risco, diferentemente do caso do trabalho dos autores citados. Logo, a realização dessa análise num local onde a PE pode ocorrer mais frequentemente fornece subsídios para que os resultados sejam extrapolados em comparação com os para os serviços que apenas prestam assistência aos casos rotineiros. Já as pacientes que não desenvolveram PE apresentaram A mediana dos valores de risco para PE precoce de 0,04%, intermediária 0,49% e tardia 1,0%. Esses números são semelhantes aos verificados por Poon et al. (2010) e Akolekar et al. (2011) em estudos realizados com aproximadamente 33 mil gestantes, nos quais os valores de risco para grávidas que não desenvolveram PE precoce, intermediária e tardia foram de 0,3%, 0,6% e 1,3%, respectivamente. Apesar do curto período de avaliação, esses dados sugerem que a Calculadora de Risco para PE da FMF é uma ferramenta útil e aplicável para a avaliação de risco 42 de PE em gestantes brasileiras. Esses resultados, no entanto, enfatizam a necessidade de que novas pesquisas sejam realizadas, no sentido de avaliar precocemente fatores específicos da paciente com risco à PE, visando prevenir as complicações advindas do desenvolvimento dessa patologia e oferecendo a possibilidade do transcorrer de uma gravidez sem intercorrências. Esses aspectos seriam contemplados num pré-natal realizado com uma série de visitas de rotina, dentro de uma abordagem mais individualizada (AKOLEKAR et al., 2011; NICOLAIDES, 2011). A proposta de reavaliar as pacientes acima do ponto de corte em períodos menores e mais precocemente, permitiria instalar o tratamento em uma fase inicial da doença, o que sem dúvida beneficia o prognóstico da gravidez. No caso da pré-eclâmpsia, a avaliação de seu risco no primeiro trimestre de gestação, por meio de ultrassom, merece igualmente que investigações futuras sejam feitas para que intervenções farmacológicas profiláticas, como administração de aspirina durante esse período, possam diminuir o desenvolvimento subsequente da doença (BASCHAT et al., 2009; BUJOLD et al., 2010; AKOLEKAR et al., 2011). 43 7 CONCLUSÕES O uso da Calculadora de Risco para Pré-eclâmpsia disponibilizada pela Fetal Medicine Foundation (FMF), associada ao ultrassom de primeiro trimestre (11-13 semanas) apresentou um bom desempenho no cálculo do risco para pré-eclâmpsia em mulheres brasileiras. Obtendo para predição de PE precoce: O melhor ponto de corte > 2,1%. Com sensibilidade de 75%, com uma especificidade de 98,2%. Obtendo para predição de PE intermediária: O melhor ponto de corte > 2,5%. Com sensibilidade de 80%, com uma especificidade de 91,2%. Obtendo para predição de PE tardia: O melhor ponto de corte > 3,5%. Com sensibilidade de 85,7%, com uma especificidade de 82,4%. 44 REFERÊNCIAS1 Akolekar R, Syngelaki A, Sarquis R, Zvanca M, Nicolaides KH. Prediction of early, intermediate and late pré-eclampsia from maternal factors, biophysical and biochemical markers at 11-13 weeks.PrenatDiagn. 2011;31:66-74. Barton JR, Sibai BM. Predicion and prevenion of preeclampsia.Obstet Gynecol. 2008;112:359-72. Baschat AA, Poon LY, Blitzer M, Nicolaides KH, Harman C. Impact of 1st trimester aspirin on population prevalence of preeclampsia. Ultrasound Obstet Gynecol. 2009;34:14. Bonilha-Mussoles FM, Ballester MJ. Gestacion normal: espaço interviloso. In:Doppler color transvaginal. Barcelona: Salvat, 1992. p. 37-54. Bossuyt PM, Reitsma JB, Bruns DE, Gatsonis CA, Glasziou PP, Irwig LM, et al.Towards complete and accurate reporting of studies of diagnostic accuracy: the STARD iniciative. Clinical Chemistry. 2003;49(1):1-6. 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Após ser esclarecida sobre as informações a seguir, caso concorde em participar do estudo, assine ao final deste documento em três vias. Você ficará com uma das vias, outra via ficará com o pesquisador responsável pelo estudo e outra ficará em seu prontuário. Caso não queira participar, não se preocupe, pois você não será penalizada de forma alguma. Em caso de dúvidas você poderá procurar o pesquisador responsável (Prof. Dr. Ernesto Antônio Figueiró Filho), pelo telefone 3345-3090 ou o Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, pelo telefone (67) 3345-7187. RASTREAMENTO PRÉ-NATAL DE CROMOSSOMOPATIAS FETAIS E DE PRÉ- ECLÂMPSIA ATRAVÉS DE EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DE PRIMEIRO TRIMESTRE. Durante o acompanhamento pré-natal, vários exames são realizados, dentre eles a ultrassonografia. Esse exame de fácil realização e sem qualquer risco tem várias finalidades como descobrir quantas semanas tem a gravidez ou o sexo do bebê, assim como descobrir doenças que ele pode ter já dentro do útero ou fazer um rastreamento destas doenças ou até mesmo avaliar o seu risco de desenvolver hipertensão durante essa gravidez. Entre 11 e 13 semanas e 6 dias de gestação podemos usar a ultrassonografia para estimar o risco do bebê ter doenças cromossômicas como, por exemplo, a Síndrome de Down ou outras doenças graves como as do coração, que podem evoluir com a perda da gravidez ou mesmo a morte da criança nos primeiros dias de vida. Dentre os métodos de ultrassom usados nesse período para estimar esse risco, temos a Translucência 52 Nucal (exame da nuquinha do feto), Ducto Venoso (exame da veia que liga o fígado ao coração do feto), Osso nasal (avalia a presença do ossinho do nariz do feto), Ângulo Facial (mede o ângulo do rostinho do feto) e regurgitação tricúspide (identifica se parte do sangue do feto faz um caminho errado dentro do coraçãozinho). Esclarecendo que não há método alternativo a ultrassonografia neste caso. Além disso, também pelo ultrassom, é possível avaliar as artérias de seu útero e estimar se há risco da senhora desenvolver pressão alta durante essa gestação. Os benefícios da Senhora participar desta pesquisa incluem a realização de exames ultrassonográficos mais aprimorados sem custo nenhum. Estes exames são realizados rotineiramente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), entretanto muitas vezes os exames são realizados em lugares diferentes, participando da pesquisa a senhora poderá realizar todos os exames no Hospital Universitário. A senhora está sendo convidada a realizar esses exames como forma de triagem pré-natal e poderá ser acompanhada durante todo o seu pré-natal até o parto pelo ambulatório de gestação de ginecologia e obstetrícia do Hospital Universitário da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, caso assim desejar. Outras pacientes do mesmo modo que a senhora também estão sendo ou serão convidadas a participar do estudo. Para que possamos continuar nosso estudo, precisamos que a senhora assine esse documento nos AUTORIZANDO a usar os dados já existentes no seu prontuário na nossa pesquisa. Lembrando que o seu nome não aparecerá em momento algum durante a pesquisa e também não haverá qualquer dano ou stress para a senhora nem ao menos necessidade de realizar outros exames, que não seja o ultrassom convencional durante o pré-natal. Se decidir por participar da pesquisa, nos autorizando o uso dos dados, deixamos claro que não receberá qualquer forma de pagamento, uma vez que a pesquisa não tem fins lucrativos e não receberá financiamento algum. De modo igual, se optar pela não participação, nenhum mal ou perdas lhe ocorrerá. Informamos ainda, que se em qualquer momento da pesquisa a senhora não queira mais participar, tem todo o direito de exigir que seus dados não sejam utilizados sem qualquer ônus, dano ou problemas a sua pessoa. Caso não deseje participar continuará sendo atendida da mesma maneira. 53 As informações desta pesquisa serão publicadas em revistas medicas da área, sem que suas informações estejam nestas publicações, garantindo seu sigilo e privacidade. Por fim, caso queira participar, favor preencha os campos de identificação (ou deixe que um de nossos pesquisadores preencha pra você) e assine. Exija uma cópia desse documento e a guarde. CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO Eu, __________________________________________________, portadora do RG nº ___________________________ e CPF nº ____________________ abaixo assinado, concordo em participar do estudo RASTREAMENTO PRÉ-NATAL DE CROMOSSOMOPATIAS FETAIS E DE PRÉ-ECLÂMPSIA ATRAVÉS DE EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DE PRIMEIRO TRIMESTRE. Declaro ainda que fui devidamente informada e esclarecida pelo pesquisador ____________________________________________ sobre os objetivos da pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação. Foi-me garantido o direito de, a qualquer momento, retirar meu consentimento de participação, sem que tal medida me penalize ou interrompa os meus direitos de acompanhamento, assistência e tratamento no Sistema Único de Saúde. Firmo o presente, _________________, _____/_____/_____, ___________________________________ Local, Data e Assinatura 54 APÊNDICE B – Questionário para avaliação ecográfica de primeiro trimestre 55 ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética